O professor-doutor
Pedro Fernandes, que assumirá a Reitoria da Universidade do Estado do Rio
Grande do Norte (UERN) em 28 de setembro próximo, na solenidade alusiva à
Semana Universitária, já possui uma série de itens para analisar, os quais
passam a ser prioritários antes mesmo da posse. Um destes se volta ao Plano de
Desenvolvimento Institucional (PDI), que se vence agora em setembro e precisa
ser atualizado para que a Uern possa participar de editais nacionais e, assim,
garantir recursos aos seus projetos de pesquisa e extensão. Além disso, outros
pontos que merece destaque são o plano diretor do campus central e a política
de expansão universitária, a qual ganhou corpo com a transformação do Núcleo
Avançado de Educação Superior (NAES) de Apodi em campus universitário. Nesta
entrevista, Pedro Fernandes fala das prioridades e do que já está sendo feito
por suas equipes ao lado da atual gestão, para que as medidas sejam efetivadas
nos primeiros momentos de sua reitoria. Acompanhe abaixo:
JORNAL DE FATO –
A discussão relacionada à criação de novos campi voltou à tona voltada à
situação do núcleo da Uern em Apodi. Como o senhor analisa essa questão?
PEDRO FERNANDES
– A Uern tem um papel importante na formação do ensino superior no Rio Grande
do Norte, sobretudo no interior do Estado. Temos hoje a participação em 16
municípios. Temos um campus central, cinco campi avançados (Assú, Patu, Pau dos
Ferros, Caicó e Natal), além de parceria com os municípios, sendo 11 deles
oferecendo ensino de curso superior no interior (Nova Cruz, Santa Cruz, João
Câmara, Touros, Macau, Areia Branca, Apodi, Caraúbas, Umarizal, Alexandria e
São Miguel). Esses municípios estão próximos uns dos outros. Nos últimos dez
anos, a Uern teve essa expansão necessária, uma vez que a gente não
identificava o sistema federal fazendo esse tipo de expansão do ensino superior
e essa realidade mudou nos dias atuais.
MAS e como fica
a questão da expansão da UERN?
ESSA questão da
expansão não compete apenas às universidades estaduais. Temos aqui a Ufersa se
expandindo e chegando a Pau dos Ferros, Caraúbas, Angicos e agora em Assú.
Temos a UFRN fortalecendo seus campi em Caicó e Currais Novos, e vai voltar o
seu polo presencial em Nova Cruz e está tentando voltar também em Macau. Temos
o IFRN, com 21 municípios com estruturas belíssimas e oferecendo cursos
técnicos e superior. E temos a Uern. Essa expansão não é algo que deva ser de
uma única instituição de ensino superior. Estamos discutindo ensino superior,
oportunidade de formação no Estado do Rio Grande do Norte e para regiões
vizinhas. A gente está discutindo com essas instituições, está vendo os
municípios, os polos e regiões que têm potencial e demanda. E assim a gente
quer chegar com a expansão superior para todo canto. E agora tem Apodi, que é a
sua pergunta.
E COMO ficará?
A Uern tem que
rever essa sua política de expansão. E por que digo isso? A UFRN está entre as
melhores instituições do País, é a melhor do Norte/Nordeste e está presente em
cinco municípios. A Ufersa também é outra instituição que tem obtido resultados
maravilhosos e está chegando ao seu quarto/quinto município agora. E a Uern,
com todas as situações de manutenção, custeio e investimentos, que a gente vê
isso na imprensa com a situação do Estado, está em 17 cidades. Está havendo
alguma contradição nesse sentido, porque a política nacional de expansão do
ensino superior do Reuni foi para as universidades federais. A política do
ensino superior privada, Prouni, foi para as IESs privadas. E hoje as estaduais
ainda arcam com a responsabilidade de formar no interior, se expandindo cada
vez mais e sem nenhuma política de incentivo de manutenção ou de custeio. Ou
seja, sem aporte financeiro. Estou contextualizando para simplesmente não dizer
que sou a favor ou sou contra. Simplesmente não conheço ninguém, no âmbito da Uern,
da comunidade e do Estado, que seja contra a criação de um campus avançado. Eu,
enquanto reitor, terei o maior orgulho de dizer que transformei de seis campi
para 10 ou 15. Contudo, quero que a gente crie esses campi de maneira
sustentável e responsável. Responsabilidade é a palavra de ordem.
O QUE o senhor
quer dizer com isso?
PRIMEIRO, a
gente tem que ver a demanda da região. Vamos trazer para Apodi: tem uma demanda
por Direito, Serviço Social e Turismo. Ao mesmo tempo, a gente sabe que o solo
de Apodi tem potencial rico, sabe que a região é rica e nenhum desses cursos
demandados vai trabalhar a região. A gente tem que ver o potencial da região e
a demanda. E por que não expandir a Uern para Apodi pensando em cursos como
Engenharia, que a Uern ainda não oferece, e curso na área da biodiversidade? A
gente atenderia o potencial da região, a demanda do País, que quer engenheiros
e expandia a Uern de forma interessante e com novos cursos. E sustentável. Não
quero que a gente passe por situações como a gente vivencia em Caicó, onde há
três anos a gente precisa de R$ 1 milhão para concluir suas obras e a gente
funciona no Caic de Caicó. Em Mossoró, temos situações como essa. Não estou
trazendo crise e sim a realidade, bem como a nossa responsabilidade em fazer
isso. Fala-se em expandir vagas. Vamos expandir. Fala-se em criação de novos
campi. Vamos criar. Agora, tudo isso com responsabilidade, com discussão e
maturidade. Não adianta, pois a Uern já mostrou que não adianta... A gente está
com a autoestima elevadíssima com a discussão de Apodi, por ter mostrado a
importância da Uern para o desenvolvimento de um município e de uma região.
E COMO está a
discussão?
TEM uma comissão
do Consuni (Conselho Universitário) discutindo. Entendo que legalmente deva
passar pelo Consepe (Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão), até para ver os
cursos. E entendo que os cursos devam atender a demanda do País, da região e do
município. Mas não é só a demanda porque alguém sempre quis fazer o curso de
Direito. É uma demanda porque ali vou formar pessoas de referência. E é
importante que a gente diga: temos o núcleo em Apodi há pelo menos dez anos
formando pessoas. Tivemos o curso de Educação Física lá e que o núcleo acabou
porque não tinha mais demanda. Temos turma de Letras e de Matemática. Em nenhum
momento, nessas discussões, escutei alguém dizendo que a Uern foi ousada e
custeou, durante estes dez anos, o ensino presencial superior naquele
município. É importante que se ressalte o empenho da universidade. Imagine que
para eu ter estes dez anos lá se deslocam carros diariamente, professores,
motoristas... A gente se empenha nos entraves da burocracia acadêmica e
administrativa... A gente queria escutar que a Uern é a melhor porque já
investe aqui. Como não vejo a importância do núcleo, começo a achar que não
valeu nada. E isso é ruim. Vamos ter calma. Não se cria universidade como se
cria uma barragem. Não é uma estrutura física que vou deixar ali. A estrutura
física é mínima.
HOJE, o núcleo
se mantém por meio de parceria com a Prefeitura. A partir do momento em que
passa a ser campus, os custos são por conta da Uern. E aí pesa...
SIM, senhor. A
estrutura fica por conta da Prefeitura e a gente, com a parte acadêmica. E a
parte do custeio, a qual a Uern não tem muito, tem arcado. Mas, quando assume
um campus, e acho que é isso que a universidade tem que fazer: assumir a
responsabilidade... Digo que não adianta dizer que tem parceria com o Município,
pois se a estrutura é ruim é culpa da universidade. Ali é o egresso da nossa
instituição. Temos o aspecto financeiro, operacional, acadêmico e o social.
Entendo que há três anos o aspecto social era maior do que qualquer outra
dimensão. Hoje, temos o aspecto acadêmico, pois o Conselho Estadual de Educação
tem nos perguntado o seguinte: avalio o curso em três dimensões, o acadêmico, o
social e a infraestrutura. Cadê a infraestrutura do núcleo? Na hora em que
coloco no projeto que preciso dessas três dimensões, preciso realmente dessas
três. Então, o aspecto acadêmico já está sendo bem complicado. O aspecto
operacional: todos os dias temos professores indo e voltando. Toda a frota está
indo para os núcleos. As aulas de campo estão sendo prejudicadas. Vocês devem
ter escutado nossos alunos se queixando da falta de ônibus, da falta de
transporte... Temos uma frota de 30 veículos que roda todo dia, indo e vindo
para os núcleos. Essa parte operacional também tem pesado. Além da insegurança.
E o aspecto financeiro: temos um decreto, orientando para cortar onde já não
tem. E cadê o aspecto social? Ele ficou menor, porque hoje temos outras
oportunidades que antes eram só da universidade. Nova Cruz, por exemplo:
voltando a UFRN, a Uern não faz mais sentido para lá. E assim você vai
replicando. De Areia Branca: fizemos um concurso (vestibular) para 40 vagas e
se inscreveram nove. Precisamos discutir com muita clareza aonde queremos
chegar.
ENTÃO, a
política dos núcleos avançados vai ser revista?
JÁ ESTÁ sendo
revista. Já tenho discutido com algumas pessoas e vamos tomar conta disso
porque é nossa responsabilidade. Hoje, temos esse desafio, de mostrar se o
egresso da universidade teve as condições adequadas para ter aquele diploma e
questionar se a Uern tem biblioteca, laboratório, isso e aquilo. Preciso ter.
Para isso, a gente vai ter que tomar algumas decisões.
ESSAS decisões
serão para quando?
TEMOS relação
boa... Temos equipe de transição que começou a trabalhar desde junho... Temos
relação muito boa com a atual gestão e sempre dialoga. Mas a gente está
aguardando tomar posse para tomar decisões que necessitem e que gerem
conseqüências. Decisões, talvez, serão tomadas agora, para a gente ter reflexão
maior e depois retome... Mas, hoje, o que quero dizer é que a Uern clama por
qualidade. O nosso aluno hoje não quer mais só vir assistir aula. Ele quer
passar o dia na instituição fazendo ensino, pesquisa e extensão. Nosso aluno
quer banheiro, residência universitária, restaurante universitário e
biblioteca, e isso estou dizendo pós-campanha. Já fui eleito e estou quase
assumindo. E é esse o nosso foco. Não adianta querer outro campus se não tenho
um campus realmente completo. A gente vai ter esse trabalho sim, de redimensionamento
das nossas estruturas. A gente está vendo a estrutura do campus central. Um
plano diretor para o campus central e um plano diretor para os campi e
identificar o que é realmente necessário e buscar recursos para dotar esses
locais. É incrível como hoje na instituição a gente reclama do custeio e da
infraestrutura, mas não reclama dos professores e do corpo técnico. O mais
difícil a gente conseguiu, que foi o material humano aqui dentro. Agora vem o
desafio, que é manter, porque se não dotarmos de infraestrutura necessária, esse
pessoal vai embora.
LOGICAMENTE que
quando o senhor fale em rever a política dos núcleos, as particularidades
econômicas das regiões serão levadas em consideração e podem surgir novos
cursos e projetos na linha da pesquisa e da extensão...
A GENTE está
falando em núcleos porque a pergunta inicial foi sobre Apodi e eu quis falar
sobre essa capilaridade da região, mas temos que rever muita coisa. O nosso
vestibular, a resolução de carga horária, a prática de ensino, pesquisa e
extensão será revista. E hoje, a universidade tem que abrir suas portas
totalmente para a comunidade. Tem até uma situação agora que a gente ia fazer
um evento e disseram que a Uern tinha um coral, mas precisamos de um coral da
comunidade também. Não posso estar isolado e tenho buscado esse contato com as
representações. E como chego lá? Por meio dos alunos. Temos o compromisso de
conhecer a demanda e o potencial da região. Agora mesmo, estivemos em Brasília (DF),
e o ministro da Ciência e da Tecnologia ficou encantado com um projeto do CT
Mineral para fazer um laboratório do sal. Ele não conhecia com propriedade a
nossa região e ele mesmo colocou no portal que quer fazer uma parceria conosco.
Jamais poderemos fazer uma parceria dessa sem contactar as salinas, as empresas
e os empresários. Que pesquisador é esse que sabe tudo sem conhecer a prática?
A nossa dinâmica será esta: de estar perto das pessoas e fazer projetos que
sejam úteis para a região.
PELO que se
entendeu, a pesquisa do sal será para agregar valor ao produto?
NA REALIDADE,
estamos provocando o Ministério, e mostrar que temos esse potencial. Ora, a
gente quer formar pessoas que possam trabalhar ali e agregar valor, quer
identificar a extração e propor melhorias no processo. A gente quer identificar
novas formas de comercializar o sal. A gente quer trabalhar a riqueza que temos
e, melhor: formar pessoas. Não é fácil, mas a gente não conhece nenhum curso de
Engenharia do Sal. A gente vê petróleo e gás, mas cadê o sal? Quando a gente
vai ver no mapa econômico do RN a relação dos produtos exportados, a maioria
está aqui na nossa região e não estamos formando pessoas que conhecem isso.
Então, será um desafio. Já temos essa iniciativa, projetos de extensão e
pesquisa. Preciso de infraestrutura, transporte e logística. Precisamos mostrar
que somos fortes, que temos conhecimento e que queremos ser grandes parceiros.
ESSE projeto
pode até contar, além do apoio do Governo Federal, do Governo do Estado, já que
vai mexer com a economia estadual?
NA REALIDADE, o
que a gente entende por uma Universidade Estadual é de que é uma grande
ferramenta para fazer o desenvolvimento local, regional e estadual. Então, você
imagine aí ter um corpo de docentes e de técnicos altamente qualificados
naquela cultura local, naquele potencial e aí você direciona políticas. A universidade
deveria funcionar assim, já que as federais atendem políticas federais. Hoje,
vejo a universidade, não porque estou nela e que serei seu reitor, como
instrumento de leis para o Governo do Estado desenvolver a região. Somos o
principal instrumento. Também estivemos no Ministério da Saúde. Temos outra
riqueza, que é o curso na área da saúde. E Mozart Sales, que é a pessoa abaixo
do ministro Padilha, disse que precisaria que levássemos a secretária municipal
de saúde, o secretário estadual de saúde e a governadora, porque precisava
discutir isso. Ele disse que a gente precisava de apoio para expandir o polo da
saúde, do ensino da saúde que temos. A gente está dentro do Governo do Estado.
Estamos dentro do Estado e estamos aptos a desenvolver políticas de Estado. São
políticas que independem de quem esteja à frente da Uern ou de quem esteja à
frente do Governo. A Uern se coloca e vai lutar por esses espaços, para mostrar
que temos potencial para desenvolver a região.
A UERN, hoje,
participa de editais nacionais, mas faltam recursos para projetos. É possível
atrair o Governo Federal e até mesmo o Governo do Estado para dentro da universidade?
TIVEMOS agenda
em Brasília, por meio da Abruem, e apresentamos as necessidades de redução da
contrapartida. Ser for convênio de R$ 200 milhões, a contrapartida será de R$
400 mil. Então, se inviabiliza. Entregamos documento ao presidente do Senado,
pedindo política nacional de apoio às universidades estaduais e municipais, no
sentido de que a cada aluno o Governo nacional possa depositar R$ 2 mil ao ano.
As universidades estaduais têm, hoje, cerca de 700 mil alunos. Somos
responsáveis por 12%. As federais estão com 13%. As privadas estão com 75%.
Somos as instituições mais capitalizadas do País, no interior, e é isso que se
quer. Então, o custo de um aluno na rede federal é em torno de R$ 15 mil a R$
20 mil. Apresentamos projeto e ficará em R$ 2 mil. O Governo Federal tem que se
sensibilizar. Nós nos reunimos também com o presidente da Câmara Federal,
Henrique Alves, que sempre colocou a realidade e a importância da Uern e
replicava para outros Estados. Conversamos com o deputado Danilo, que se
comprometeu em inserir emenda para reduzir as contrapartidas. Na quarta-feira,
teremos reunião com o ministro Aluízio Mercadante, para colocar a ideia de
aporte de R$ 2 mil por aluno para andar. Foram situações que estão se
concretizando. Também fomos recebidos pelo ministro da Ciência e Tecnologia e
saímos de lá para fazer projeto de encomenda. Em nenhum momento se prometeu
nada e pediram projetos. E é isso que iremos fazer. A gente entende que o Governo
Federal quer se aproximar das instituições e formar pessoas de qualidade. Agora,
as IES precisam se aproximar do Governo e discutir internamente. O diálogo tem
nos aproximado. Recentemente, conseguimos depósito em conta de emenda do
deputado Betinho Rosado de 2011, de R$ 1,2 milhão, para compra de equipamentos.
Fonte: Jornal de Fato